domingo, 7 de fevereiro de 2010

Elogio a uma escritora de valor

Cara Senhorita Y:
O estudo de qualquer texto literário, ainda os mais simples, implica limites reais de competência crítica. Então confesso: o teu comporta significados bem mais numerosos e maiores do que pode dar conta esta mera e breve leitura...
Ainda assim, arrisco:
Predominam em tua literatura a solitude, a angústia do abandono, dos fins-de-caso, a solidariedade, a esperança e o amor a Deus (e revolta pelo descaso celeste).
O vocabulário, bem pobre, repetitivo e previsível, não condiz com tua imensa riqueza e experiência interiores. Conselho-segredo: lê mais: mais gramática, mais figuras de linguagem, mais autores, mais teóricos da Literatura. Adianto todavia que não vislumbrei quaisquer desvios da norma culta nos escritos: tudo correto, portanto. Aplausos solenes.
Sugeriria eu: diversifica teus temas, alçando-os a outras dimensões (denunciando as fomes, as guerras, a ausência crônica das liberdades democráticas em tantos países, as péssimas, desumanas condições de vida dos prisioneiros da base americana de Guantánamo, em Cuba (e outras superprisões pelo mundo afora...).
Tal não farei, todavia. Por quê? Porque tua temática, o Amor, é inesgotável. como inesgotáveis são os assuntos de tantos e tãos bons literatos, como Augusto dos Anjos (os fatos horrendos da vida e da morte), João da Cruz e Sousa (a negritude, a injustiça, o preconceito, a Imensidão celeste), e outros admiráveis autores.
Logo, continua mas amplia e enriquece teus versos e prosa, melhoráveis sim senhora. Afinal, quantos alcançaram e alcançarão a imortalidade cantando um só assunto? --- Poucos, porque existe também nas letras uma seleção natural.


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Sê menos chorosa, não te lastimes assim tão banalmente. Transforma essa dor, essa alegria, esse amor, esse ódio, essa revolta, essa mágoa, essa treva em uma única e gigantesca tocha, que nos ilumine --- que para isto escreves: iluminar-nos e receber os reflexos dessa iluminação, sob a forma de leituras, comentários, análises...
Aliás, as opiniões dos comentaristas nada mais refletem que lenços imaculados, que piedosos consolos. Recusa tais sentimentos vazios. Exige mais respeito literário. (Então, escreve melhor!)
Achei teus textos regulares, lamuriosos, medíocres. Literatura barata. Mas plena de boas intenções. Faltou transformar tais intenções em convincentes versos, em majestosa prosa.
Todo mundo te elogia ou consola, triste sofredora isolada que te apresentas. Discordo dessa atitude paternal, antiliterária dos colegas. Tens que ser confrontada com a covardia que demonstras ao negociar com as palavras, todas tão mal medidas e pesadas.
Lembra-te de que em breve eu, tu e toda essa geração passaremos, findaremos, e virá outra, e outra...
Se queres ser lida e estudada por essas ‘outras’, dilacera-te verbalmente, criatura! Sem maiores melodramas ridículos!


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Creio porém que, fugindo às costumeiras exclamações de quem borboleteia superficialmente sobre uma escrivaninha, preferi a autenticidade e o exame profundo de alguns trabalhos somente, livrando-te de cândidas e levianas afirmações, como:

“Oh mas que beleza, poetisa!!”
“Gostei do seu versejar. Visite-me!”
“Lindo lindo! Amei de paixão...”
“Grande, grande talento!"
"Que beleza... Gostei, ou melhor, adorei!!"
"Gente, que lindo!"

Mas afirmarei convicto, e sem as mesuras corriqueiras:
"Sim, teus escritos convencem como literatura, instigam, revoltam, nos esbofeteiam também. E encantam pela verdade artística implícita. Beijos."


Escrito em 29/12/2008.
Modificado 18 vezes até 08/02/2010.
Tempo gasto: sete horas.

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